Mistérios do Ser 1 - Autor retrato
Porque motivo? Ou. O que raio me rege?
Para que reaja de forma tão diferente
e para mim surpreendente...
De pessoa para pessoa.
De estímulo para estímulo.
Vulnerável com o que em mim é
permeável. Sensível.
Que mundo é este? E quão vasto pode
ser um mundo interno de alguém?
Organismos vivos. Relações humanas.
As pessoas.
As pessoas com quem vou interagindo e
convivendo...
Pessoas diferentes despertam facetas
diferentes de mim. Coisas que eu não sou ou não deteto ser. Pelo
menos quando estou só. É chocante.
Solidão é como chão. E é por isso
que precioso de estar só... às vezes. Volto à minha estufa para
que de novo me possa ver ao espelho.
Interações disparam focos de luz em
faces diferentes da minha lua escura e sempre nua.
Quase sempre à flor da pele. A flor é
flor de estufa. Gosta de se proteger em clima ameno. Essa criatura
vegetal julga que aprendeu que não gosta lá muito de aventura e
cansa-se quando passa muito tempo na rua. (Semi autocrítica)
E é de forma misteriosa...
É de forma misteriosa que surgem as
coisas.
Despertam-se me coisas.
Coisas variadas e surpreendentes.
Coisas com que não me identifico mas
que identifico.
Coisas que estão em mim ou são parte
de mim ou estão a ser.
Certamente não sei.
Vagamente também não sei se é certo
que não sei.
O espetador contempla não estar
consciente sobre o que realmente se passa para lá do palco e da
cortina que forma o cenário. Isto enquanto o espetáculo ocorre
indiferente ao que se passa para lá dos olhos do espetador e no
espetador. Que já não sabe em qual dos espetáculos é que há de
focar a sua atenção. Erguem-se palcos internos. Simultaneamente
acontecem coisas em diferentes níveis e dimensões. Tudo no mesmo
organismo.
Não estou consciente sobre quem
realmente sou.
E assusta.
Ver que me conheço tão mal e que tão
pouco me identifico com o que vou sendo. Assusta.
Assusta “de morte” ser este
organismo em que habito e sem conhecer os cantos à casa.
De facto constato que as profundidades
do meu inconsciente são mesmo profundas.
Mais do que poderia ou posso imaginar.
São fundas.
E eu nunca as vi porque alguns quartos
da casa são escuros e também não sei se têm poços nem sei se
realmente é perigoso.
Não sei se é perigoso quando dou por
mim a mergulhar e perder o pé... e a não ver o fundo. Nem sei se no
fundo há um fundo.
Perante aquilo que vou sentindo
sinto-me no escuro.
Anseio então por algum esclarecimento.
Preciso de descansar.
Ou de uma breve distração.
Quero pelo menos e só por um pouco
agarrar algum tipo de entendimento para que me possa orientar.
Mas o sentir é diferente do observar.
E do ver...
Pois bem. Talvez não seja assim tão
diferente.
Mas é!
Aceitar a sensação que vem:
Contemplar. Absorver. Assentar. Digerir... isso só vem depois.
Depois de um sentir no escuro do
inconsciente. Desprovido de lanterna, segurança, capacete ou
proteção adequada à modalidade radical que é andar sobre uma
corda bamba. Há sempre o sentimento de que se está em perigo de se
cair em desequilíbrio interno.
E o que acontece quando se cai? Boa
pergunta!
Podem acontecer muitas e variadas
coisas em muitas e variadas dimensões.
Portanto... também não sei o que pode
acontecer nem o que isso irá trazer.
Não é certo. E não sei se é bom ou
se é mau, ou se o será.
É o que é ou o que vai sendo.
Também não tenho bem a certeza se o
perigo é real. Mas a verdade é que se sente.
O perigo.
Pela minha experiência é um grande
susto em que se fica num certo sentido como que perdido.
Quando se tem consciência para se ver
que se está perdido e ainda por cima no escuro.
E o que se faz?
Fica-se às apalpadelas numa espécie
de frenesim.
Frenesim de quem quer desesperadamente
ver e não vê...
Até que chega o cansaço e se acaba
por desistir de se lutar contra a situação iminente...
Sobra então o espaço para que a vida
possa continuar no dia seguinte quando se volta a acordar, e se for o
caso.
A vida é misteriosa e intensa.
A música de fundo muda mas a viagem
não termina.
O espetador está tão só no presente
a ser essa (sua) observação que não se reconhece. Nem reconhece em
si nenhum padrão. Ele não se vê a si mesmo.
E mesmo quando julga que se está a ver
esquece-se de que há alguma coisa a ver que ele não vê e por isso
o que ele vê já não é o espetador mas sim parte do espetáculo.
(Matrix). Neste sentido a ideia de espetador é apenas uma
personificação simbólica do ver.
Portanto... Como vou reparando nestes
aspetos da perceção... a ideia de quem sou acaba por ser vaga,
difusa, irregular... Um padrão sem padrões dentro.
Ou qualquer coisa como uma tapeçaria
irregular (manta de retalhos) em que vão surgindo pequenos padrões
que se alternam sem regra aparente... e por isso sem seguir nenhum
padrão.
Frequentemente sou para mim um fantasma
quase apagado.
O lençol que o cobre tem vincos de
intensidade que traçam os traços vincados de uma personalidade numa
camada mais à superfície desta ideia. Mesmo assim os vincos deste
lençol são momentâneos e por isso a verdade sobre eles está
sempre a mudar.
O espetador contempla a confusão pelo
seu olhar levantada ao constatar estas mudanças climáticas
surpreendentes. Tempestade de areias.
E é estonteante.
Já não acredito.
E cada vez é mais difícil cair na
crença.
Na crença de que eu seja alguma coisa
que sinta ou pense ser.
Somente estou aqui.
Tenho um corpo. Tenho uma vida. Tenho
memórias. Tenho padrão e padrões... Tenho este organismo em que
vivo através de. Ou vou tendo uma ideia sobre isso.
Somente vou transportando estas coisas.
Tenho-me assim.
E mesmo esta visão de mim não passa
de mais uma visão que emana do meu solo, de mim.
Penso que ninguém pode definir os seus
próprios limites. É sempre uma parte a querer definir um todo.
E parece ser por natureza misterioso.
Esta perspetiva ou forma de ver é
acompanhada por um forte contraste de sentimentos alternantes. Em
certa medida ocorre-me um certo fascínio e uma curiosidade
construtiva.
Noutro sentido há uma sensação de
estar mergulhada num esmagador tédio nada construtivo, destrutivo
até, que apela a um vazio trémulo e triste.
Existe um forte sentimento de gratidão
que abraça esta existência e ao mesmo tempo uma intensa frustração
que ecoa num grito de dor no decorrer deste abraço.
Os contrastes que embatem uns nos
outros geram eletricidade atómica que se alimenta a si mesma e se
intensifica num caos ardente e sedento de paz.
Toda esta sopa fervilhante transborda e
escorre na direção de um oceano de indiferença fria e à primeira
vista infértil e desprovida de vida.
A sede de paz é temporariamente
saciada nessas águas até que um novo ciclo recomece.
Crescer é como transformar pequenos
círculos em espirais infinitas.
Sinónimo de viajar.
Também a tudo isto me hei-de tornar
mais resistente.
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